segunda-feira, 6 de junho de 2011

Favela, Cultura e Periferia.


A música é uma forma de cultura exportada da Favela. 
   Favela e Cultura. Essas duas têm sido pautas constantes de discussões acadêmicas. O grande motivador do debate é o uso impróprio dos sinônimos de cada uma delas, o que acaba gerando distorções em torno dos conceitos. É comum ouvirmos a utilização do termo cultura em referência somente à arte e ao acumulo de conhecimento, enquanto o significado da palavra dá conta de que cultura é sinônimo dos modos de vida de um povo, e, portanto, é produzida por todas as pessoas em sua interação.
   A partir deste conceito, é possível perceber o quanto são preconceituosas colocações como, por exemplo: “Esta é uma forma de levar cultura à favela” ou “ As favelas são locais carentes de cultura”. Ambas as frases, encontradas tanto no cotidiano das pessoas quanto no dia-a-dia dos veículos de comunicação, refletem a absorção de um conceito equivocado de cultura. Entendendo por Cultura tudo aquilo que é resultado da vida social, da aprendizagem, tudo aquilo que você adquire da sociedade é cultura.
   Mais do que a distorção de um conceito, o modo de pensamento citado acima, pode ser um indício de uma ação etnocêntrica, aquela segundo a qual a cultura de uma das partes é sempre considerada melhor que a cultura alheia. É uma visão etnocêntrica que gera essa idéia de só conceber a sua visão e seus próprios valores, vendo o diferente como desigual e inferior. Essa visão gera uma incapacidade de lidar com as diferenças e desigualdades.
   É comum ouvirmos, em diversos locais, as pessoas dizendo que fulano ou beltrano não tem cultura. Este é um exemplo claro de ação preconceituosa, etnocêntrica. A exclusão de certas formas de fazer cultura acaba excluindo os sujeitos dessas formas. Essa frase de levar cultura à periferia mostra a idéia de que não há cultura e que os moradores desses locais não são realizadores de cultura. É uma dupla discriminação no sentido dos lugares e dos sujeitos. 
   A música, a dança, as artes plásticas, todas as manifestações artísticas encontradas nas vilas e favelas, o que inclui o funk, o pagode e o rap, fazem parte da produção cultural local, assim como as manifestações encontradas nos demais lugares fazem parte da cultura. No entanto, cultura não se restringe a arte, mas abrange diversos campos sociais. Caminhar, trabalhar, namorar, casar, estudar, cozinhar, tudo isto é cultura. Essa forma de reduzir a cultura à arte, e mais do que isso, às belas artes é excludente no sentido que elimina uma série de outras manifestações, formas de pensar o mundo e os sujeitos. Os agentes dessas formas de pensar, agir e estar no mundo são excluídos, numa postura discriminatória.
   Não apenas o conceito de cultura pede reflexões, mas também o de periferia. O termo é comumente utilizado como sinônimo de favela. O que os pesquisadores observam é que os bairros periféricos onde a renda da população é mais alta, não são designados socialmente pelo termo periferia. O conceito de periferia é reduzido ao distante, mas na cidade contemporânea não tem apenas um centro. Hoje o termo periferia diz respeito a lugares e sujeitos objetos de abandono das políticas. Percebe-se que a grande maioria das favelas está na zona sul, na zona leste, mas estão na periferia do ponto de vista econômico. 
   O termo periferia está muito marcado pela questão social. Os grandes centros urbanos usam o termo periferia para caracterizar as áreas ao redor do centro que foram sendo ocupadas pelos poderes populares. No entanto, as regiões como o Alphaville, em São Paulo, embora estejam às margens do centro geográfico não são chamadas de periferia, o que demonstra que o termo não é mais utilizado como define sua origem na geografia. 
   Mais do que a transferência do caráter regional do conceito para o econômico, o que preocupa aos pesquisadores e pessoas que trabalham nas favelas é a relação do termo periferia com ausência. A periferia não pode ser caracterizada pelas ausências, ela é sempre lembrada pelo que não tem. Cada vez mais tentamos olhar a periferia pela o parâmetro da presença. O esforço para alterar a injustiça e a discriminação em relação ao que existe de fato nas favelas tem surtido efeito. A periferia não se caracteriza mais como um local visto pela ausência da cultura, mas como um espaço que constitui a cidade sob outra perspectiva.

   Outra forma possível de perceber-se a periferia passa pelo reconhecimento de que os seus habitantes desenvolvem formas ativas e contrastantes para enfrentarem suas dificuldades do dia-a-dia, de acordo com suas trajetórias pessoais e coletivas, as características socioculturais e geográficas do seu território e a postura assumida pelas suas lideranças e pelas instituições locais, dentre outras variáveis. Naturalmente, a superação dos evidentes limites presentes nas condições de vida dos habitantes da periferia é uma necessidade, a ser encarada pelos poderes públicos e pelos setores sociais identificados com a democracia e a justiça social. Ela passa, porém, pela quebra da hegemonia das referências sociocêntricas, pela criação de mecanismos de diagnóstico e definição de ações que levem em conta os saberes construídos pelos moradores, em sua longa e intensa caminhada por uma vida mais plena.

Um comentário:

  1. olá, adorei o blog , acho que esse é realmente como já foi dito um assunto que deve ser discutido em salas de aula , pois é onde o conhecimento deve evoluir, segundo os diferentes aspectos da vida humana levando-se em consideração as desigualdades e consequentemente a marginalização das pessoas, num Estado que se diz Democrático , que tem como fundamento da República a Dignidade de pessoa humana , e que tem como objetivo a igualização dos membros de tal nação, a favela se mostra na verdade um paradoxo , na medida em que o Estado não cumpre efetivamente o que se propõem, muitas vezes não por incompetencia , mas pelo grande número populacional nas cidades , que como vocês muito bem sabem (tem mto mais poder de dizer) foi decorrÊncia da urbanização acelerada, e a não adaptação das cidades recém surgidas.

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